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19 de Novembro de 2013 09h02

Artigo - A consciência negra existe?

19/11/2013

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A questão etnorracial é algo que desperta em nós brasileiros vários sentimentos positivos e negativos intimamente ligados ao processo de colonização. Participar do processo de colonização do Brasil não foi nada fácil para as três etnias pioneiras. O branco, o índio e o negro.

O negro que chegou ao Brasil na condição de cativo participou do processo produtivo de forma direta, tendo sofrido as dores desse desenvolvimento. Já no início do ciclo do açúcar sente-se a sua presença nas lavouras e engenhos do açúcar brasileiro no nordeste.

A condição de cativo sem liberdade transformou o negro em peça. Peça de trabalho, objeto de uso e desuso sob a conveniência do seu amo e senhor branco. A expectativa de vida variava muito, e o cativo morria devido a uma correlação complexa de descaso físico, maus tratos, dieta inadequada e doença.

A falta de alimentação, roupas e moradias apropriadas, em combinação com os castigos, enfraqueciam-no e preparavam-no para ser liquidado por vírus, bacilos, bactérias e parasitas que floresciam na população urbana. Ao analisar dados de diversas fontes, mostrou que no Brasil do último quarto do século XIX a expectativa de vida dos escravos, ao nascer, variava em torno de 19 anos. Imagine isso no século anterior. 

Transformar um ser humano em “coisa”, em máquina de produção diversa, é para os nossos olhos atuais, em algo muito, muito paradoxal aos olhos da lei.

De um lado uma sociedade de extrema religiosidade na época, controlada “pari passu” pela igreja e estado, e que juntos forneceram a ideologia do nosso país. Controle de nomes dos lugares, de pessoas, da obrigatoriedade das liturgias, de uma língua europeia recheada de caracteres e expressões bíblicas e racistas.

Exercendo de outro lado, uma violenta e facínora mortandade de mais de 5  milhões de negros trazidos a força. Metade do holocausto que Hitler praticou contra os Judeus.

O uso dos negros nos trabalhos forçados acontecia em regiões agrícolas, nas minas de metais preciosos e nas cidades em trabalhos domésticos, ou como escravos de “ganhos”. No caso das negras, transformadas em “mulheres públicas”.

Resistir a esse tipo de trabalho aviltante era algo corriqueiro no cotidiano dos escravos afro-brasileiros.  Diferentes formas de resistências foram praticadas por eles. Do suicídio ao “banzo”, dos assassinatos de seus senhores aos infanticídios, e os que se aventuravam no sertão além da colonização portuguesa, criando comunidades denominadas de Quilombos.

No Brasil criaram-se diferentes quilombos que resistiram bravamente aos ataques de bandeirantes, capitães do mato, milícias reais e durante o império o uso até do exército na captura desses fugitivos. Vida difícil para quem não pediu para ser aprisionado na África, e levado a força em navios “tumbeiros”.  A sorte de chegar vivo ao Brasil, não era a mesma nos trabalhos praticados em nosso país.

Viver em Quilombo era uma expectativa interessante para muitos corajosos que adentravam na natureza virgem, criando comunidades famosas como a de Palmares no estado de Alagoas. É de lá o único herói negro brasileiro: Zumbi.

Dos nossos quilombos é bom lembrar os dos arredores de Cuiabá e Chapada dos Guimarães (Mutuca, Sanguessuga, etc.) em Cáceres e Vila Bela. O mais lembrado sempre é o Quilombo de Quariterê ou Quilombo do Piolho. Este quilombo ficou conhecido também como o quilombo comandado por uma mulher; a rainha Tereza de Benguela, que hoje tem seu nome lembrado em uma das escolas da rede municipal de Cuiabá.

Se de um lado era alegria pura para os negros, para os senhores um verdadeiro tormento, pois ele, branco, não pegava no pesado e transformava a natureza em produtos comercializáveis. Isso era tarefa da “coisa”, do “objeto”, da “máquina negra”. Uma máquina individual que chegava a custar um quilo de ouro da época.

Por que comemoramos o dia 20 de novembro, como o dia da consciência negra?  As condições de vida, o IDH do negro, do pardo, do mulato, mudaram desde o ato de 13 de maio de 1888?

Redefiniu-se o direito do negro através de cotas de ingresso na educação superior, como uma forma de compensação do passado sangrento e por muito não bem conhecido ou lembrado. A igualdade étnica ainda é um sonho no Brasil, mas só de lembrar que temos um herói negro num pais como o nosso, é um degrau nessa escala social da cidadania.

Prof. Pedro Carlos Nogueira Felix

Historiador/Professor

      Autor dos livros História de Mato Grosso e Cuiabá centro da América do Sul